segunda-feira, 26 de julho de 2010

ESSA LUA...

Andar a esmo na beira do mar, procurando um talvez ou talvez só andar.



A praia ao lado da rua, é flor no concreto, na cidade em movimento o mar entende tudo.


Sem mais por que, na tarde dando lugar à noite, todos olham na única direção.


De repente eis a lua, mas não é apenas a lua é a pura suspensão.


Entre flashes de máquinas e verdadeiros delírios, a bola cor de fogo que não é o sol, não cabe em nada.


A necessidade humana de registrar não consegue alcançar um milimetro de sua grandeza.


O horizonte vira um pintura e a cidade frenética continua.


Alguns compreendem certas dimensões da existência.


Olhar é apenas um sentido de tantos outros ocultos e incompreendidos.


A lua dá sentido a tudo. Ou tira o sentido de tudo. Se é que deve haver sentido. Ou precisa.


E ela, tão cheia, preenche o momento de vazio, que para muitos é a paz.


Oh, lua que é não branca de fulgores e de encanto...
 

domingo, 25 de julho de 2010

MÍSTICO É BOM



(Ela está sentada no café do cinema escrevendo algo em seu caderninho. Ela chegou mais cedo e aproveitou para passar uma ligeira maquiagem . Ele a olha e se encanta. Ele se aproxima, compra uma água e senta na mesa ao lado. Ele a olha. Ela o olha. Ela não sabe o que fazer. Se continua escrever, se dá um sorriso, se olha pra ele. Ele não sabe o que fazer. Se vai até ela, se continua olhando, se desiste.)


Ela: Oi.


Ele: Oi


Ela: Eu não costumo fazer isso.


Ele: O quê?


Ela: Falar “oi” assim pra qualquer um.


Ele: Ainda bem que eu não sou qualquer.


(Ela ri)


Ele: Assim é melhor.


Ela: O quê?


Ele: Você sorrindo.


(Ela sem graça)


Ele: Prazer, André.


Ela: Luana


Ele: Luana. Bonito. Tá esperando alguém?


Ela: Tô.


Ele: Ah, desculpe.


Ela: Uma amiga.


Ele: Que bom.


Ela: E você? Tá sozinho?


Ele: Em que sentido?


Ela: Agora.


Ele: Não.


Ela: Ah, tá...


Ele: Tô com você.


Ela: Oi?


Ele: Não estamos aqui, juntos?


Ela (ri): É verdade. Eu quis dizer se você tá esperando alguém.


Ele: Não.


Ela: Que bom.


(Ele ri)


Ela: Você também fica melhor assim.


Ele: Que bom.


(silêncio)


Ele: Que filme você vai ver?


Ela: Não é um filme. É um documentário.


Ele: O Espelho de Pedra?


Ela: Esse. Você também?


Ele: Puxa, pior que não...


ela: Ah, tá...


Ele: Esse eu já vi. É muito bom...


Ela: Legal.


Ele: Na verdade, eu não vim pra ver nada.


Ela: Não?


Ele: Na verdade, eu te vi escrevendo e achei que esse poderia ser o melhor filme daqui: você escrevendo.


Ela (ri): Nossa, to honrada. O melhor filme daqui... (sorri)


Ele: Pois é...


Ela: Obrigada...


Ele: Pareço que eu sou louco,?


Ela: Não, imagina. Eu até gosto.


Ele: Que bom.


Ela: É meio místico.


Ele: Místico?


Ela: É... místico...


Ele: E isso é bom?


Ela: Muito bom. Nesses dias, é bom.


Ele: Que bom... quer tomar...


Ela: Um vinho?


Ele: … Sim!


Ela: Quero.


Ele: Mas e a sua amiga?


Ela: Ela não vem.


Ele: Não vem?


Ela: Eu tava brincando. Eu não tô esperando ninguém.


Ele: Ah, é?


Ela: É...


Ele: Que bom...


Ela: É...


Ele: Então vamos?


Ela: Aonde?


Ele: Qualquer lugar.


Ela: Qualquer lugar é ótimo.


Valéria: Luana? Luana? Luana!!!


Ela (acordando de um transe): Oi! Val, desculpa, chegou há muito tempo?


Valéria: Cheguei há alguns minutos. Que mundo que você tá?


(Ela olha para o homem a olhando. Não diz nada.)


Ela: Deixa pra lá. Já comprei os ingressos. Vamos?


(Ela guarda seu caderninho. As duas entram na sala de cinema. O homem continua a observando sem também falar nada.)






FIM.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

CORDEL DAQUILO QUE FICA

A vida é tão efêmera... o que importa a gente não pode pegar...


Nasceu nesse mundo com o objetivo de quem quer chegar no topo do ar.

Na sua escola nem jogava bola, ficava atento para sempre passar
Foi o primeiro aluno de toda sua época, o exemplo de alguém que sabe estudar
Era o mais elogiado, o mais avançado, o mais queridinho de todo o lugar


Traçou uma reta , um objetivo, seguiu seu caminho sem nunca hesitar
Já cedo entrou no primeiro estágio, entre centenas de gente, foi o primeiro lugar
Trabalhou obstinado, fazia hora extra, ficava sem dormir, sem jamais reclamar
Era o mais comentado, o mais animado, sem dúvida que iriam o efetivar.



Não perdeu muito tempo, precisava imediatamente se aprimorar
Se inscreveu no inglês, no francês e espanhol e até japonês pensou em falar
Preocupou-se com seus bens e depois de alguns salários comprou um jaguar
Pensou na aparência e um “personal stylist” ele resolveu contratar


No auge dos trinta, já era um chefe que todo mundo queria bajular
Acordava cedo, corria na praia, abria e-mails e ia trabalhar
Saia do escritório, corria pras aulas de dança e de canto, era preciso extravasar.
Ia pra casa, via o jornal, é muito importante saber se informar


E assim foi seguindo sua vida, entre trabalhos e metas, muitas maravilhas ele ia conquistar
Talvez seria o homem mais rico de sua geração, mas isso ele não ligava, o importante era avançar
Não tinha tempo pra nada, eram muitas demandas para administrar
Passo a passo ele conseguia ser aquilo queria: um homem exemplar


Um dia, andando na rua, sempre atolado, resolveu descansar
Sentou num Café da esquina, pediu um xícara e começou a tomar
Uma moça bonita apareceu e justamente ali do seu lado ela foi se sentar
E ele, que nunca havia prestado atenção em alguém, não conseguia parar de olhar


Ela era uma mulher muito bela, talvez a mais bela que ele já viu
A moça também olhou pra ele e por alguns segundos ela sorriu
Aquele sorriso era tão puro, tão cheio de graça, que seu mundo caiu
Esqueceu de qualquer outra coisa e se perguntou da onde ela surgiu

Já ia falar com a moça, se encheu de coragem, o momento era o agora.
A moça, sentindo que era com ela, mexeu no cabelo e fingiu ver a hora.
E ele levantou, olhou-a de novo, ela tinha um olhar que ele adora.
Mas quase chegando nela, seu celular tocou, era do trabalho e ele tinha que ir embora.

Viveu muito anos sem nunca parar
Comprou uma casa na cidade, na montanha, no campo e no mar.
Viajou o mundo todo, conheceu quase tudo em todo lugar.
Teve tudo o que queria, sempre sabia aonde queria chegar.

Era um homem invejável e toda a imprensa o entrevistou
Um grande empresário, rico e famoso, o mais estiloso, quase um show
Conheceu muita gente, bebeu muito vinho, trabalhou e trabalhou.
E todos o olhavam, por dezenas de anos, foi sobre ele que mais se falou.

Um dia de sol, daqueles mais lindos, alguma coisa o fez parar.
Dirigindo seu carro, sentiu algo estranho que o abalou
Seu coração que era tão forte começou a frear.
Parou o seu carro e imediatamente uma ambulância chamou.

Já no hospital, nas últimas horas, olhou para trás e viu sua vida passar
Nas suas memórias , lembrou da moça bonita do café, e aí ali estagnou.
Pensou no olhar da moça, e os filhos que com ela não teve, e as viagens que com ela não fez, só porque atendeu seu celular.

De tudo o que viveu, de tanto trabalho, aquele olhar foi a única coisa que ficou.
Viveu muita coisa, mas morreu sem amar.

terça-feira, 20 de julho de 2010

PROCURA-SE O CENTRO

Mulher num balcão de informações da Rodoviária.



M: Boa tarde, é aqui mesmo o balcão de informações?

H: Sim, senhora, em que posso ajudá-la?

M: Ai, eu estou tão emocionada!

H: Alguma coisa em que possa ajudá-la?

M: É que eu sempre quis encontrar um lugar assim, sabe? Um balcão de informações.
Aqui vocês podem me responder tudo, não é?

H (hesita): Sim, senhora, tudo relacionado aos lugares que tem dúvidas de chegar.

M: Nossa, que lindo!

H: Desculpe, senhora, mas o que é lindo?

M: Não é lindo? Um lugar onde a gente tira dúvidas da onde queremos chegar? São tantas...

H: Não, senhora, não é bem assim...

M: Então você não tira dúvidas?

H: Sim, senhora, mas depende...

M: Não é pra isso que você existe? Para tirar dúvidas?

H: Sim, de certa forma...

M: É o que está escrito aqui. Balcão de informação, não é?

H: Então, senhora vamos objetivar, qual é a informação que a senhora deseja?

M: Eu ando a procura do centro.

H: O Centro?

M: Sim. Está tão difícil...

H: Essa informação é fácil, senhora.

M: Jura?

H: O Centro é o lugar mais fácil de achar por aqui.

M: Sério? Que loucura. Desde que eu nasci , eu nunca conseguir encontrá-lo. Sempre andei tão perdida... Isso sim é lindo. Finalmente alguém vai me dizer aonde fica o centro!

H: O centro da cidade fica ali à...

M: Oi?

H: “Oi” o quê?

M: Que centro que você disse?

H: O Centro da cidade.

M: Não!

H: Não o quê?

M: Eu não quero saber onde fica o Centro da Cidade!

H: Ué, minha senhora, mas não é por isso que a senhora...

M: Não! Não, não, não! Esse Centro não me interessa.

H (já bem assustado com o que está acontecendo): Ah, então é o Centro da onde que a senhora quer saber?

M: Olha pra mim e tenta descobrir.

H: Desculpe, mas tem outras pessoas precisando...

M: Não dá pra saber? É tão nítido. O meu centro! Olha! Veja como me falta um centro! Eu nunca o encontrei.

(O homem fica estagnado, sem saber o que dizer)

H: Bom...

M (quase chorando): Me ajuda, por favor, o senhor precisa me ajudar. Esse lugar era a minha última esperança. Eu tinha tanta esperança que aqui eu saberia onde fica o meu centro.

H: Fica calma...

M: Ficar calma? Como? Você acha que é fácil ser uma mulher sem centro? O senhor acha?

H: Olha...

M: Toda a minha vida foi isso: uma mulher sem centro. Eu sou uma mulher descentralizada! E agora? O que eu faço?

( O homem, após alguns segundos sem saber o que dizer)

H: Olha, eu saio do trabalho em meia hora.

M: E daí?

H: E se... E se... quem sabe?

M: O quê?

H: E se a gente tomasse um chopp?

M: Oi?

H: É que te ouvindo falar, eu percebi que também ando meio sem centro. Me sinto um pouco assim, sabe? Vivo dando informações aos outros, mas as minhas próprias andam meias perdidas. Quem sabe a gente não possa trocar uma ideias sobre isso?

(Um sorriso no semblante da mulher. Silêncio e espera angustiante.)

M: Tá... Pode ser... Te espero no Bar do Rui. Em meia hora.

H: Bar do Rui em meia hora. Combinado.

M (felizinha): Então tá... até... Meia hora... Bar do Rui...

(Ela vai saindo)

H: Ah! Onde fica o Bar do Rui?

M: Ali, no Centro!

(O Homem sorri)

FIM

sábado, 17 de julho de 2010

COISAS DA CHUVA

Na chuva a gente fica buscando algumas coisas que possam nos emocionar
porque o friozinho do inverno é mais permissivo e dá espaço às grandes emoções.
Numa dessas buscas chuvosas, me deparei com a seguinte letra, cantada pela
voz abençoada de Mônica Salmaso (que está no link em baixo)



Na Volta que o  mundo dá

Composição: Vicente Barreto e Paulo César Pinheiro


Um dia eu senti um desejo profundo

De me aventurar nesse mundo
Pra ver onde o mundo vai dar


Saí do meu canto na beira do rio
E fui prum convés de navio
Seguindo pros rumos do mar


Pisei muito porto de língua estrangeira
Amei muita moça solteira
Fiz muita cantiga por lá

Varei cordilheira, geleira e deserto
O mundo pra mim ficou perto
E a terra parou de rodar


Com o tempo
Foi dando uma coisa em meu peito
Um aperto difícil da gente explicar


Saudade, não sei bem de quê
Tristeza, não sei bem por que
Vontade até sem querer de chorar


Angústia de não se entender
Um tédio que a gente nem crê
Anseio de tudo esquecer e voltar


Juntei os meus troços num saco de pano
Telegrafei pro meu mano
Dizendo que ia chegar


Agora aprendi por que o mundo dá volta
Quanto mais a gente se solta
Mais fica no mesmo lugar

http://www.youtube.com/watch?v=lxT4MUnOWm0&feature=related

domingo, 11 de julho de 2010

O HOMEM MORTO E A VIOLONCELISTA


Inteiro




A vida para ele era uma verdadeira queda para a escuridão. Era assim como ele se sentia: Numa queda para escuridão. De repente, nada mais fazia sentido. Como se as ondas que guiavam seu caminho congelassem no tempo, e para descongelá-las era preciso olhar profundamente para dentro, o que ele não consegui fazer. Então parou. Estagnou todas as suas expectativas em relação ao seu futuro. Ficou paralisado no presente, sentindo cada segundo escorrer de suas mãos, sem nada fazer, sem nada querer. Era um estado de conformidade. Simplesmente não sentia vontade nem de lutar, porque se o fizesse, entraria em contato com sua dor mais obscura, teria que ter a coragem mais brava dos homens para encarar suas escórias mais ocultas e vencê-las. Para quê? Se ele não sabia, não valeria a pena. Não que estivesse feliz. Isso ele não estava. Mas também não estava triste. Apenas estava, sem adjetivos . Não vale a pena dizer o que o fez ficar assim. A vida rege cada ser humano entre curvas misteriosas que nem todos são capazes de decifrá-las. Não importava. O que deixou assim não foi algo específico. Talvez uma conjuntura de acontecimentos, todos eles bem pequenos e cheio de detalhes, que unidos, viraram um universo no vazio. Ele assim foi ficando sem questionar e sem impedir. Assim foi, se afastando de sua luz, sem saber que se afastava. E um dia ele já não. Conseguia entender tudo. Isso ele nunca deixou de ter: a consciência sobre todas as coisas. O bem e o mal humano: A consciência. Resolveu acatar o que lhe sucedia, sem nunca deixar de entender. Se assim sua vida quis, assim tinha de ser. Morreu em vida e não permitiu enterro nem dor.


Uma noite, sem planejar, porque sua morte em vida não permitia o controle do tempo, andava desinteressado pela Cinelândia. Apesar de morto, não pôde deixar de perceber o forte movimento de pessoas na porta do Theatro Municipal. Lembrou que na época em que era um homem cheio de vida, uma de suas maiores alegrias era ver os concertos que o teatro oferecia. Era a sua melhor época. Procurava entrar em qualquer concerto que fosse. O poder inebriante da música o deixava verdadeiramente feliz, uma felicidade sem condições impostas, a felicidade plena. Um micro movimento corporal fez vibrarem suas veias e, como se tivesse recebido uma pequena descarga elétrica , sentiu suas células mortas mexerem em seu corpo. O que podia ser? A lembrança dessa época sem cobranças, ou a ideia de ouvir um concerto novamente, coisa que não fazia desde que morrera consciente?

Pela primeira vez sentiu como se lhe passassem a perna. Pela primeira vez não conseguiu entender o que estava acontecendo. Para onde foi a consciência de todas as coisas? Da onde vinha aquela sensação e por que ela vinha com tanta intensidade? Não queria nada. Não esperava nada. Apenas sentia, e sentir, em sua atual condição, era algo mais que forte e algo forte o assustava, não queria lidar com isso, não podia. Virou as costas para o Municipal e entrou no buraco do metrô, na caverna acolhedora da solidão, na sua gruta interna, assim era mais fácil e assim ele queria. Partiu dali, com medo de reviver qualquer coisa.

Ele nunca havia chorado. Nem quando perdeu seu maior amor, por puro descuido, ou imaturidade. Não chorou nem quando percebeu que foi por isso que perdeu seu amor. Não chorou. Talvez sua morte em vida fosse um castigo por não ter chorado. Não que fosse insensível. Ao contrário. Gostava das coisas mais peculiares da vida e dava valor a elas. Como um olhar de um vira-lata, um bebê sorrindo, a pipa no alto fazendo piruetas, o barquinho ao longe parecendo um quadro. Contemplava cada pequeno detalhe como se! Mas não chorou nem por um segundo. Um dia ele tentou chorar. Lembrou de seu falecido pai, quando criança, e o quanto o amava. Mas em vão. Falhou. E nunca mais tentou. Nem tentou tentar.


Agora ele estava descendo as escadas do metrô, fugindo, mais uma vez, de qualquer coisa que...


Até que pudesse acontecer algo que... Até que... Aconteceu!


Ele a viu. Uma mulher. Uma mulher correndo. Uma mulher correndo de vestido. Uma mulher correndo, de vestido, com cabelos avelã. Uma mulher, correndo, de vestido, com cabelos avelã e olhos castanhos. Uma mulher, correndo, de vestido, com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando algo. O quê? Sim! Uma mulher, correndo, de vestido, com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo? Era isso? Uma mulher, correndo, de vestido, com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo! Um violoncelo! “Ah, dor, por que chegas com tanta intensidade no meu peito frágil e me empurras de volta às rodas de som da vida?” Uma mulher, correndo, de vestido, com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo, no metrô! Uma facada na alma. Haveria de pensar: entrar ou não no trem? Porque entrar no trem seria dizer não à mulher, correndo, de vestido , com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo. Certamente ela iria tocar. Precisava pensar e... cadê? Aonde foi? Cadê a mulher, correndo, de vestido, com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo? Aonde foi? Será que o pensamento demanda tanto tempo a ponto de perder uma mulher, correndo, de vestido , com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo, de vista? Não!! Teria ter que tomar uma atitude! Mas estava tão neutro e assim era tão bom... Não! Tentou lembrar o que o fizera andar sem rumo na Cinelândia. Não teve resposta. Andava sem rumo em todos os cantos sem motivo. O trem chegou. Entrar ou não? Que saco! Há tanto tempo não sentia isso que se chama escolha. Olhou para trás novamente. A viu. Estava saindo do meio de um grupo de pessoas, com pressa, segurando o violoncelo e os cabelos... ah! Escolha? Não teve escolha. Foi. Atrás da mulher, correndo, de vestido com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo. Subiu novamente as escadas do metrô de volta ao mundo, quem sabe de volta à luz. A mulher se dirigia aos fundos do teatro. Mais uma vez sentiu espasmos de vida e se assustou. Seu corpo tremeu. A mulher entrou no teatro e ele sabia que não o deixariam entrar pelos fundos sem se apresentar: “Boa noite eu sou um homem morto e só estou atrás daquela mulher, correndo, de vestido , com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo” . Não iriam deixar.


Teve que entrar pela frente e, para isso, foi preciso comprar o ingresso. Comprar o ingresso: ato social de quem vive em comunidade e se adéqua a ela. Há quanto tempo não fazia isso? Comprar um ingresso de um concerto, ou de qualquer outra coisa. Sem motivação, a única coisa que se pode fazer é economizar. Pagou. Entrou. Quanto medo. Quanta angústia. Era preciso desistir. Que loucura. Sou um homem morto. Aliás, não sou homem. Sou um morto. Aliás, não sou. Aliás, não. Desistiu. Nem ia pedir o dinheiro de volta. Pra quê passar por isso? Mais contato humano desnecessário. Virou-se. Esqueceu da mulher, correndo, de vestido , com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo. Ainda bem! Ainda bem! Não quero, não posso, não deixo. Não! Ia sair quando tocou o terceiro sinal e ouviu uma curta nota que vinha de um violoncelo afinando. Lembrou da mulher, correndo, de vestido, com cabelos avelã, olhos castanhos e segurando um violoncelo. Era por isso que estava ali, sem compreender, pela primeira vez, o que lhe acontecia. Era por causa dela que correra, que comprara o ingresso, que entrara naquele teatro, palco de suas maiores aventuras emocionais e que ele mesmo deixou o tempo imperfeito ofuscar. Era só por isso e isso não era só. Respirou fundo. Respirou fundo. Respirou fundo. Fundo. Fun...do.... uma sensação estranha. Seu corpo já estava tão acostumado a inércia que, respirar fundo, era o mesmo que correr 40 quilômetros de uma vez, sem nunca ter feito exercício. Quase se sufocou ao sentir o ar do teatro entrando por seus tímidos pulmões sedentários. Respirou fundo e entrou de uma vez ...

Apesar de ter entrado num concerto de música clássica, era como se estivesse num musical com as músicas do Cole Porter.


O mundo entrou em suspensão e pela primeira vez, depois de muito e muito tempo, sentiu seu coração bater de verdade, sentiu cada pontada da batida como um chamado da alma para algum lugar, quem sabe, algum lugar além do… Sentou em uma cadeira qualquer e foi além. A solidão, que até então não se fazia presente, o golpeou de tal jeito, que ele não conseguia se manter parado na cadeira. Sentiu ela o penetrar tão intensamente que por algum segundo percebeu sua morte de outro ponto de vista e quase gritou no meio do teatro. Um grito de socorro, de ajuda . Se ali parecia um sonho, na verdade, era nada mais que um acordar para … Então ela começou. A violoncelista que todo mundo já conhece, de vestido e etc...


Ao vê-la, quase urrou. Não de entusiamos mas de dor. Uma dor que ele nunca pensou que sentiria. A dor que a sala da emergência do hospital mais equipado da cidade é incapaz de identificar, a dor mais mais interna, adormecida, que um dia acorda e não deixa ninguém ileso.


Por que, então, não fugir dali imediatamente e retornar à escuridão confortável da inércia? Mas agora? Seria isso possível? Fechou os olhos e se imaginou dançando uma música lenta com uma menina da adolescência que era apaixonado, a sensação de desespero que era dançar colado com alguém , calculando a melhor hora de agir, sem saber o que fazer. Se imaginou pisando, autista, na grama do jardim de seus avós e observando o dia dar lugar a noite naquele mesmo jardim cheio de segredos seus. Imaginou um filme do Jerry Lewis, o quanto amava e quanto gargalhava com ele na infância, e até mesmo há algum tempo atrás antes de morrer. Ousou sentir saudades. Ousou sentir.


A violoncelista começou a tocar os primeiros acordes do Prelude de Bach. Agora seu coração palpitava, espasmos acelerado, a sensação forte de vida o fazia acreditar que ia morrer de verdade. Uma ataque fulminante do coração, não ia aguentar. O homem morto ia deixar o corpo. Viu o teatro de cabeça para baixo, viu sua vida indo embora, o coração acelerado não dava tréguas. Um golpe certeiro, agora tinha certeza, passaram-lhe a perna, planejaram contra ele, quiserem que ele chegasse naquele momento, sentisse a dor de viver e morresse de vez, sem ladainhas. E assim ele estava, morrendo em morte, na frente da violoncelista que o hipnotizara até ali. Amaldiçoou-a por dentro. Em seu delírio de morte, o Prelude de Bach se transformou em Night and Day do Cole Porter cantado por Ella Fitzgerald e ele estava sapateando com a violoncelista nas nuvens alaranjadas do cenário de Hollywood.


Abriu os olhos e ela estava olhando para ele, ou parecia que estava, olhando para ele, como se adivinhasse a sua dor, como quem quer dizer: “Eu sei tudo o que está acontecendo com você e não vou aliviar nada.”


Porque ela o olhava e … Sorria? Ela sorria. Sim, ela sorria para ele. Que ego dizer que era para ele. Ela simplesmente sorria. Mas para ele, ela sorria para ele e, dane-se o ego. Era sim para ele. Já não bastava apenas tocar os acordes que acordam sua alma e ainda tinha que sorrir? Se ainda não tinha morrido do coração, agora era questão de segundos. O sorriso dela o fez sentir tristeza, tanta tristeza, tanta, tanta, tanta. O obrigou a ser triste porque não podia ser feliz. Mas o que é a felicidade se não uma grande tristeza disfarçada de alegria? A voz de Ella, ainda se fazia presente em sua mente. Era Ella cantando Porter e a violoncelista tocando Bach num quarteto inesquecível.


Ela olhava para ele. Ela o sentia. Ela o percebia e talvez por isso sorria.


De repente, o homem morto era o único vivo naquele teatro. Ele tremia com a música, ele respirava alto, ele sentia espamos, ele... ele... ele chorava!!! O homem morto chorou pela primeira vez. Um homem morto chorou. Lágrimas caiam em enxurradas mais fortes que uma tromba d´gua no fim do verão . As pedras do seu rio eram levadas pela água e nada, nada, nada, o faria parar naquele momento. As pedras que o travaram, agora eram obrigadas a rolar. O poder do choro vai muito mais além. Chorava com a violoncelista linda e maldita que o fez chorar pela primeira vez. Chorava de pêsames pela sua morte em vida e chorava porque o choro ainda não significava que voltaria a viver, apenas chorava. Chorava de dor pela sua solidão há tanto ignorada e que agora era maior que qualquer coisa que pudesse imaginar. Chorava pela sua existência, pela existência alheia e chorava também de felicidade por sentir seu choro pela primeira vez. Chorava e chorava porque estava ali chorando. Agora já não tinha mais a consciência de nada. Agora ele era um ser perdido em seu choro e talvez seria apenas por isso que era capaz de ser. Talvez soubesse no íntimo que a sua morte o mudara a partir daquele momento e conviver consigo mesmo seria um futuro em transtorno. Sabia que não poderia voltar a morrer, mas também não sabia se volatria a viver. Chorava. E rezava para não parar de chorar. Algumas pessoas do teatro, talvez as mais sensíveis, o perceberam chorando e até compartilharam um pouco desse choro por causa do efeito da música, mas jamais saberiam o que de verdade o fazia chorar.


A violoncelista não parava de sorrir, como se tivesse cumprido a sua missão. Não a de tocar lindamente como sempre fazia, mas de fazer um homem morto chorar.


Então agora ele já não ouvia Bach, nem Cole Porter, agora ele ouvia, e até poderia cantar uma música gospel de redenção. Levantaria daquela cadeira e soltaria um agudo vibrante como Stevie Wonder faria tão bem. Oh Lord!


E o choro não parava por nada e não pararia. O homem morto tem água por dentro! Agora ele era o melhor dançarino do Grupo Corpo, agora ele era.


A violoncelista fazia sua melhor performance. Agora ela estava genialmente virtuosa.


Então ele, como nunca fizera antes, resolveu olhar pra fora, com o canto dos olhos e se perguntou.


Por quê?


Porque, por que, por quê? Porque, porque...




FIM.


quinta-feira, 8 de julho de 2010

DESCULPA, PRECISAVA VOLTAR


"Na fila do banco é tanta anestesia de ser, que é possível acontecer o sexo explicito e ninguém reagir."




Ela tinha que entrar na Caixa Econômica. Sim, Caixa Econômica. Precisava resolver alguma coisa com seu pis, ou seria o seguro desemprego? Ela precisava entrar. Também tinha que depositar um cheque em outro banco. Precisava também tirar umas xerox na esquina, assinar uns papéis num escritório, pagar as contas atrasadas. Ela precisava. Era uma realização, pequenas vitórias do dia, pequenos desafios concretizados, alívios, espasmos de ser gente, adulta, sim, era preciso ser adulta.




Então se via: rua, carros, barulhos, freadas, bagunça, gente, gente, gente, quanta gente!


Copacabana é mesmo um bairro muito intenso. Alegre e triste, colorido e obscuro. Mas então, não podia desistir, acordou para isso, ou melhor, dormiu pensando nisso, não podia desistir. Chega de adiar o dia. Preparou uma pasta de documentos, abriu a caixinha do correio do prédio, tirou uma infinidades de contas e avisos atrasados e foi. Decidida, mulher, adulta, independente. Foi.


Nossa senhora de Copacabana! Lá estava ela. Altiva. “Hoje sou adulta”. Estava até mais bonita. Sentia. Olhavam-na. Era a roupa? Talvez. Se arrumou todo para tal missão. A unha fizera no dia anterior. Era preciso se sentir bonita. O desafio era grande.


Porta do banco. Aconteceu o primeiro calafrio. A fila era enorme. O banco estava sem ar condicionado. Homens, mulheres, crianças, adolescentes, idosos já não eram mais pessoas. Eram como animais na fila para ganhar sua ração. Hesitou, ouviu um latido de um cachorro singelo, se distraiu com ele, mas não podia, respirou fundo, o primeiro passo, entrou. Foi para a fila, não podia, tinha que pegar uma senha. O numero? 235. Que numero estava? 189. Haviam ainda 46 pessoas em sua frente. Fez a conta: cinco minutos para 46 pessoas, no mínimo 230 minutos de espera, que significam, quase 4 horas de espera. Começou a suar. O batom, ali, já havia saído. Ainda tinha tanta coisa pra fazer. Mas o que fazer? Esperar? Abriu a bolsa. Pegou um livro de contos estratégicos para filas. Começou a ler. Leu 15 minutos e não aguentou mais. Já era outra, a outra pior. Suava frio, apesar do calor infernal do banco sem ar. A moça ao lado bufava. O menino no colo da mãe chorava. Por que tinha que estra ali? Por quê? Ah! Lembrou. Tinha que receber o seguro desemprego. Aquele dinheiro viria em boa hora. Podia viver sem ele, mas com ele tudo seria melhor. Tudo? Pensou bem. E se voltasse amanhã? Não! Todo dia ela adiava, precisava encarar. Seu coração palpitava. Não entedia. Quanta dificuldade. Era apenas um banco. O mundo real. Olhou pra a porta e lá fora estava ventando. Adorava o vento. Lá dentro, calor, lá fora, a brisa que vinha do mar. Mar!!! Por que lembrou dessa palavra? Enquanto ela estava ali, na primeira etapa do dia, encarando 4 horas de espera, ele estava lá, na praia, num vai e vem eterno, o eterno movimento que acalma a sua alma nas horas de dor. Seus olhos mudaram. É como estivesse hipnotizada. Tirou os sapatos no meio da fila. Alguns olharam, outros disfarçaram, mas a verdade é que ninguém entendeu nada. Não reparou em ninguém. Só pensava no mar. Ali estava tão quente... e o seguro desemprego, e o pis? É verdade. Que loucura, coloca o sapato! Colocou -o de volta. Segurou na mulher gorda da frente pra ter certeza que estava ali. “ Desculpa, precisava voltar”. Ela disse, sem graça. Mas voltar da onde? Do surto. A mulher gorda olhou-a com raiva e disse: “ Gente louca!” Gente louca? Estava se referindo a ela? Muito provavelmente. Foi ela que a segurou nos braços e disse uma frase totalmente desconexa: “Desculpa, precisava voltar”. Então se enxergou. Será que estava louca e não havia percebido? Pensou na análise que tinha deixado de fazer alguns anos atrás. Mas não... loucas eram aquelas pessoas, naquela fila, naquele calor, naquele tempo... será que a necessidade é tão grande que reprime o ser humano a tal ponto que se deve aceitar essa condições? Coisa que não aconteceria em país desenvolvido. Odiava pensar isso: Só porque aqui é terceiro mundo. Odiava ter que admitir isso. Tentava entender as sequências históricas para chegar nesse ponto e não havia duvidas. Todas as questões arraigadas da colonização se faziam presentes naquele mesmo presente aterrorizador de estar numa fila de um banco público, sem ar condicionado, com poucos funcionários e gente, muita gente, que...


Um música. Uma música no ar. Ouviu uma música! Era uma boa música. Uma dessas novas cantoras com voz de quem acabou de acordar, gostosinha, sem muita extensão, mas cheia de simpatia, cantava uma especie de “new soul” americano, uma hino de paz. Da onde vinha? Olhou para todos os lados e procurou suspeitas. Olhou diretamente para os jovens que levam seus Ipods, MP3, celulares musicais, mini lapt tops, o que tiver que ser , para tudo quanto é lugar. Enfim, a música vinha de algum lugar e a deixava feliz. Um pouco de magia no deserto burocrático. Sem perceber seu corpo estava se mexendo. Não! Não estava no filme “Vivendo a vida adoidado” cantando beatles e todo mundo ali ia começar a dançar numa coreografia uníssona, como se estivem ensaiado a vida toda. Sabia disso e tentou se controlar. Mais uma vez, o controle social civil para se adequar ao padrão cotidiano. Mas a música estava lá. Um ipod oculto, um celular que chamava e ninguém atendia de propósito. Ou seria do próprio bancário que para escapar de sua rotina opressora, ouvia secretamente debaixo da mesa a música dos anjos? O fato é que a música a fez lembrar do mar mais uma vez. Lembrou dele, da sua cor, da cor do céu. O sol nessa época proporciona cores espetaculares na natureza. Ai, que dor estar ali. Mas não tinha o direito para ir para o mar. Era meio da semana, todos deviam estra trabalhando ou resolvendo alguma burocracia da vida!!


Horror. Como pensar que poderia estar no mar? E a roupa bonita, e unha que fizera? Não podia. Mas a música... Ah, o poder da música é algo que jamais iremos compreender. Nem ela. A música causava um efeito tão libertário, tão avassalador . É pra isso que estamos vivos? Para encarar as filas de banco? A musica falava algo sobre o quanto você me fez bem, o como não fez bem , mas já estou bem... ou seja, mais uma musica sobre amor, de novo, nada além do padrão, mas não era isso que importava, o que importava era a musica simpática no caos. MARRRR!! Ele gritava agora em seus ouvidos e reinsistir era muito difícil. Tirou o sapato de novo. Que louca, deveriam pensar. Ou não. Na fila do banco é tanta anestesia de ser, que é possível acontecer o sexo explicito e ninguém reagir. Tirou o sapato, tirou o casaco, soltou o cabelo. Mais uma vez chamou a mulher gorda da frente. “Pode segurar a minha bolsa por um instante?' A mulher olhou de novo, com repreensão, sem entender absolutamente nada, mas no automático que estava segurou sem questionar. Então foi!! Quatro horas de espera! Haveria tempo suficiente. Fugiu! Fugiu dela, fugiu deles, fugiu do banco, fugiu da vida, fugiu do presente, fugiu do passado, fugiu! É muito difcil ser adulta por muito tempo. É facial ser mulher, ser adulto, alguém é? Ela foi mulher. Não foi adulta. Ou foi adulta e não foi mulher? Não importa. Ela foi!


Pro mar!!!! quatro de horas na fila, ou quatro horas nadando, quebrando e transgredindo a rotina imposta as massas? Copacabana, princezinha do mar. Posto Cinco! A musica do banco ainda estava em sua cabeça. Tudo bem. Melhor que a voz de qualquer um reclamando qualquer coisa, o que é comum na cidade grande. Melhor que o telefonema da operadora que liga para cobrar o atraso. Melhor que. Obrigada à pessoa que ouvia a musica! E a bolsa? Não confiara demais na mulher gorda? Tudo bem, é só uma bolsa... nem é só, mas tudo bem... Ali tava tão bom. Um alívio. O inverno é lindo mesmo. É sol sem calor, um carinho no corpo. E lá ficou até chegar a hora de voltar e ser atendida. Quando voltou para o banco, toda molhada , com um sorriso na cara, feliz, ninguém reparou. A moça gorda estava lá com a sua bolsa, e como se o tempo não passasse a devolveu. Estranhamente a música ainda tocava. Será que era o som ambiente? Vai saber... Era mulher, adulta, criança, era ela mesma... Agora sim podia continuar seu dia. E assim foi.












http://www.youtube.com/watch?v=dtslwxL_Leg

terça-feira, 6 de julho de 2010

O HOMEM CONCRETO

Por fora tem graça, um ser boa praça que todo mundo quer.
Por dentro tem lascas de uma amargura que nem sabe o que é
Lá fora caminha de rua em rua, sorri pra quem quiser
Lá dentro ele chora e nem sabe a hora que acorda pro café.


E segue de fora pra dentro de dentro pra fora tentando disfarçar
A dor que o devora, assola, assombra, escória da vida, ferida convicta que chega pra ficar.
Ao andar nas calçadas é tudo, é todo, pessoas vão olhar.
Nos bares errantes, o mais elegante, mulheres vão chegar.
No trabalho ele engana, firmeza , destreza, o cargo que almeja vai ganhar.
Nas festas anima, dança, fascina sem hora pra acabar.


Mas no apartamento, parede concreta, não tem pra quem sorrir.
Acaba sofrendo de tanto vazio, sem ter pra onde ir.
É o homem imperfeito, com todo direito, podendo até fugir.
Buscando um sentido pra toda bagunça, precisa prosseguir.


E dorme de novo, o dia chegando, nem lembra o que sonhou.
Coloca a roupa, querendo andar nu, mas seu celular tocou.
Não era ninguém, talvez era sim, precisava ser alguém.
Alguém que o salvasse, o chamasse, o amasse, fizesse o que quiser.
E então como sempre, encarou seu presente e pra vida retornou.
Fingiu um sorriso, um quê de alegria e a porta ele fechou.
Foi sempre sabendo que a sua essência, um dia ele deixou.

VOLTAS




Certos papéis têm frases inteiras,
De maravilhas que se perdem ao vento.
Certos janelas têm momentos secretos,
De um casal que um dia se amou.
No apartamento, um universo sagrado,
Tão infinito que chora escondido.
Certos olhares são mensagens ocultas,
De uma história que um dia acabou.
E o horário do tempo é sentido em qualquer movimento.
E o medo pergunta se é temporário qualquer sentimento.

Certas palavras são anjos encarnados,
E revividas em sonhos serenos.
Certas memórias são lindas viagens,
Uma passagem que volta mais forte.
Na gota que cai, há um mar de batidas,
O coração que não pára pra nada.
E o tempo perfeito, encontra ao longe um lar acordado.
E entrega sua alma ao lar que acolhe seu tempo.

segunda-feira, 5 de julho de 2010


Sorte do dia: Não saber o que pode acontecer.

Num conto do escritor polonês Isaac Bashevis Singer
chamado “Alegria” ele diz:

“...vida significa livre arbítrio, e liberdade é Mistério. Se alguém soubesse a verdade, como podia haver liberdade? Se o céu e o paraíso fossem no meio da praça do mercado, todo mundo seria santo...”

Esse conto tá no livro 47 contos de Isaac Bashevis Singer, uma coletânea de seus melhores contos ao longo de sua agitada vida entre Polônia, Estados Unidos e Israel. Eu recomendo, sempre que leio me emociono.

Re começando


Eu amo tudo o que foi
Tudo o que já não é
A dor que já não me dói
A antiga e errônea fé
O ontem que a dor deixou
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.


Fernando Pessoa

Pensei em tantas palavras para começar a semana
que nada me foi mais fiel que as do grande poeta acima.

As voltas improvidas do mundo são as que sempre nos trazem de volta a vida
e nos tiram da sonolência cotidiana.
Que elas nunca parem.

Primeira divulgação


Divulgo a volta do site de dramaturgia que escrevo semanalmente.
www.dramadiario.com
Ele voltou ao ar numa semana muito especial.
A semana dos musos inspiradores, onde cada autor convidou um “muso” para escrever em seu lugar.
A semana começa HOJE com minha convidada Adriana Falcão
Confiram o novo formato do site!

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Tarde de inverno


É como se tempo parasse.
E parasse as mazelas da vida, as feridas abertas,
a tristeza, a moça perdida.
Ao olhar a vista a moça parou de se lamentar.
E colocou seus pés na água e começou a caminhar.
O mar a acolheu e a luz no final da tarde do apoardor
A trouxe de volta para o que é seu.
A lágrima que antes caia, agora cedeu.
Um sorriso de paz apareceu, e na imensidão do azul alaranjado
tudo resnaceu.
Celebrou o momento presente.
O que se ganhou se perdeu, e o que se perdeu, não perdeu.
Então continuou...

A primeira


fazendo jus ao nome do meu blog
Palavras ao tempo
inicio com algumas delas.

Fuga inversa

Não quero apenas falar de amor
Existem muitas outras coisas pra contemplar
Como uma casa no alto, a brisa no corpo, a nuvem no ar.

Não quero falar de amor
Bater coração, tremer de paixão, isso não.
Quero falar de correr na esquina , brincar com o porteiro
Cantar o vizinho, olhar um veleiro

Cansei de falar de amor
Só me resta andar pelas ruas,
cidade frenética, a tarde é poética,
sai sol entra lua.

Pra que falar de amor,
Se o lanche é gostoso, o pão é cheiroso
O café ta fresquinho,
E o bebê no carrinho

Decidi que o amor não será mais meu tema
Pensei em cinema, parti pro teatro
beijei o ator no último ato.

Juntei os pedaços de outros dilemas
Cantei um música, recitei um poema
Andei para um lado virei para outro
Me encontrei num cansaço, virei um bagaço

O desespero bateu
A fuga doeu
O sentimento cresceu

Fugir desta coisa, me fez perceber
Que o céu, o veleiro, a lua, o porteiro, a brisa, o bebê
O café , a esquina, o pão, o cinema, o teatro, o ator.
Não são coisas nem casos.
Não risos nem dor
São o fruto mais puro de um imenso amor!