terça-feira, 20 de julho de 2010

PROCURA-SE O CENTRO

Mulher num balcão de informações da Rodoviária.



M: Boa tarde, é aqui mesmo o balcão de informações?

H: Sim, senhora, em que posso ajudá-la?

M: Ai, eu estou tão emocionada!

H: Alguma coisa em que possa ajudá-la?

M: É que eu sempre quis encontrar um lugar assim, sabe? Um balcão de informações.
Aqui vocês podem me responder tudo, não é?

H (hesita): Sim, senhora, tudo relacionado aos lugares que tem dúvidas de chegar.

M: Nossa, que lindo!

H: Desculpe, senhora, mas o que é lindo?

M: Não é lindo? Um lugar onde a gente tira dúvidas da onde queremos chegar? São tantas...

H: Não, senhora, não é bem assim...

M: Então você não tira dúvidas?

H: Sim, senhora, mas depende...

M: Não é pra isso que você existe? Para tirar dúvidas?

H: Sim, de certa forma...

M: É o que está escrito aqui. Balcão de informação, não é?

H: Então, senhora vamos objetivar, qual é a informação que a senhora deseja?

M: Eu ando a procura do centro.

H: O Centro?

M: Sim. Está tão difícil...

H: Essa informação é fácil, senhora.

M: Jura?

H: O Centro é o lugar mais fácil de achar por aqui.

M: Sério? Que loucura. Desde que eu nasci , eu nunca conseguir encontrá-lo. Sempre andei tão perdida... Isso sim é lindo. Finalmente alguém vai me dizer aonde fica o centro!

H: O centro da cidade fica ali à...

M: Oi?

H: “Oi” o quê?

M: Que centro que você disse?

H: O Centro da cidade.

M: Não!

H: Não o quê?

M: Eu não quero saber onde fica o Centro da Cidade!

H: Ué, minha senhora, mas não é por isso que a senhora...

M: Não! Não, não, não! Esse Centro não me interessa.

H (já bem assustado com o que está acontecendo): Ah, então é o Centro da onde que a senhora quer saber?

M: Olha pra mim e tenta descobrir.

H: Desculpe, mas tem outras pessoas precisando...

M: Não dá pra saber? É tão nítido. O meu centro! Olha! Veja como me falta um centro! Eu nunca o encontrei.

(O homem fica estagnado, sem saber o que dizer)

H: Bom...

M (quase chorando): Me ajuda, por favor, o senhor precisa me ajudar. Esse lugar era a minha última esperança. Eu tinha tanta esperança que aqui eu saberia onde fica o meu centro.

H: Fica calma...

M: Ficar calma? Como? Você acha que é fácil ser uma mulher sem centro? O senhor acha?

H: Olha...

M: Toda a minha vida foi isso: uma mulher sem centro. Eu sou uma mulher descentralizada! E agora? O que eu faço?

( O homem, após alguns segundos sem saber o que dizer)

H: Olha, eu saio do trabalho em meia hora.

M: E daí?

H: E se... E se... quem sabe?

M: O quê?

H: E se a gente tomasse um chopp?

M: Oi?

H: É que te ouvindo falar, eu percebi que também ando meio sem centro. Me sinto um pouco assim, sabe? Vivo dando informações aos outros, mas as minhas próprias andam meias perdidas. Quem sabe a gente não possa trocar uma ideias sobre isso?

(Um sorriso no semblante da mulher. Silêncio e espera angustiante.)

M: Tá... Pode ser... Te espero no Bar do Rui. Em meia hora.

H: Bar do Rui em meia hora. Combinado.

M (felizinha): Então tá... até... Meia hora... Bar do Rui...

(Ela vai saindo)

H: Ah! Onde fica o Bar do Rui?

M: Ali, no Centro!

(O Homem sorri)

FIM

2 comentários:

  1. Adorei, Rê !!! Genial! Próxima vez que encontrar alguém com um colete de "posso ajudar" já vou levando um listinha com angústisa existências a serem sanadas... hehe

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  2. Ehehe. eu já fiz aminha listinha. ta na bolsa.
    to só esperando a hora!

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